domingo, 20 de janeiro de 2013

Sobre Moral Religiosa, Queda Original E Outras Coisas

Supor que a moral objetiva seja uma verdade por simples questão instintiva é um fiasco. Nosso cérebro nos engana a todo momento. Se você girar por algum tempo é bem provável que fique enjoado e vomite. Ele irá interpretar a mudança "estranha" das paisagens ao seu redor como um envenenamento e o fará colocar para fora tudo o que o seu estômago "comeu" pela manhã. É bem provável que você escolha coroa logo depois de jogar uma moeda para o alto e dar cara algumas vezes. Entretanto, as vezes anteriores não tornam mais provável, ou improvável, que caia cara de novo. As possibilidades ainda são de 50%. O cérebro humano força o homem a encontrar ordem nas coisas. Se você estiver dirigindo o seu carro e encontrando um poste à cada 4 minutos, ele já irá supor que haverá outros à frente, Isso, entretanto, é algo que pode não ser verdade. Pode ser que você só encontre outro poste dentro de 9 ou 10 minutos.

Alguém pode dizer que se não houver um Ser totalmente bom, nós não teremos nenhum padrão para dizer o que é bom e o que é mau, mas se esquece de que se não há nenhum padrão para dizer o que é bom e o que é mau não podemos dizer que Deus é um ser totalmente bom. O que estaremos por fazer é simplesmente andar em círculos. Um religioso que diz que Deus existe e que Ele ama a humanidade possui a mesma credibilidade que um ateu que diz que se Deus existisse, Ele provavelmente comeria crianças no café da manhã. O ateu não pode provar que Deus, se existisse, comeria crianças no café da manhã? Por acaso, podemos provar que Deus nos ama? São apenas dois pressupostos vazios no fim das contas. Dizer que Deus é bom e o "pecador" é ruim é o mesmo que dizer que café é saboroso e que chá é repulsivo ou que macacos são feios e golfinhos são bonitos. O termo "existir" vem do latim "existere", que é formado por "ex", "fora" ou "saído" e "sistere", "estar" ou melhor "permanecer". Existir é "estar fora da mente", seja ela qual for. Deus estaria sujeito a isso também. Não é Ele quem não possui prazer na morte do ímpio? O simples desejo d'Ele não pode mudar certas coisas da realidade. Não há nenhuma razão para achar que certos gostos sejam mais elevados e que estejam fora da nossa mente. Não é também porque alguma coisa exista que eu tenha que dedicar minha vida à ela. Hitler existiu e muita gente não concordaria com ele, independentemente de qual era o seu poder na Alemanha nazista.

Para que a moral fosse objetiva, ela deveria ser uma verdade da razão, ou seja, necessária, e não contingente, deveria ser inconcebível que ela não fosse deste modo, mas isso claramente não ocorre. O triangulo possui três lado e é inconcebível algum que não os tenha. Assim como é inconcebível que todas as extremidades de uma circunferência não sejam igualmente afastadas do centro. Se supormos, entretanto, que a moral, é uma verdade de fato, ela não poderia ser objetiva, pois as verdades de fato são acidentais. Assim como a existência das estrelas, das nuvens e de tantas outras coisas que passaram a existir e que podemos conhecer através da experiência. No fim das contas, a moral divina seria simplesmente a imposição de uma subjetividade. O fato de Deus ter pintado a cadeira de vermelho, algo acidental, realmente me obriga a reconhecer que a cadeira é vermelha. Porém, não quer dizer que eu não posso pintá-la de outra cor. A imposição de uma cor para a cadeira não me faz sentir obrigado a aceitá-la, pois seria concebível imaginar uma cadeira com alguma outra cor ou um mundo sem cadeiras.

Meus amigos apelam para os Pais da Igreja a fim oferecerem um conceito alternativo à "queda original". Se eles reconhecem que estavam errados quando adotavam a perspectiva de Agostinho, um pai da igreja, se baseando apenas em sua "inspiração divina", por que deveriam acreditar em outro "Pai da Igreja" pelo mesmo motivo? Se, apesar de crer na "inspiração" paulina, eu percebo que o apóstolo estava equivocado em algum ponto, por que eu deveria adotar a perspectiva de algum de seus sucessores, por também serem "inspirados"? Na verdade, eu corro o risco de descartar um mito e substituí-lo por outro. C. S. Lewis, por exemplo, abriu mão de Adão e adotou o "homem paradisíaco". Todo o conhecimento que as ciências puderam me oferecer até aquele momento foi simplesmente jogado no lixo.

Meus amigos costumam dizer que Deus não começou a existir. Entretanto, como diz Heidegger, existir significa "estar no mundo". Se Deus se temporizou ao criar, Ele começou a existir a partir do momento que criou o mundo.

Existem certos atributos divinos que são sem razão entendidos como incomunicáveis. Seria o caso, por exemplo, da onisciência e da perfeição moral. Um atributo, entretanto, só poderia ser exclusivo se não fosse concebível a existência de nenhum outro ser que o possa ter. Dizer que atributos, como estes que eu citei, seriam atributos exclusivos de Deus seria o mesmo que dizer que um cientista nunca será capaz de criar vida em laboratório porque Deus é a fonte da Vida ou o mesmo que dizer que só Deus tem o poder de amarrar os cadarços porque até hoje não conheci ninguém que tenha sido capaz de fazer isso.

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