terça-feira, 1 de março de 2011

Jesus, O Novo Testamento e a Moralidade Veterotestamentária

Geralmente muitos teólogos afirmam que o caráter proibitivo do Antigo Testamento seria um "treinamento divino" ou "sombras do porvir", mas não temos nenhum motivo para considerar esta possibilidade e ignorar o óbvio. Ao olhar para o Antigo Testamento me deparo com muitos valores primitivos, supersticiosos, preconceituosos, mitológicos, toscos e sem crédito ou validade para a sociedade em que vivemos. A sua natureza proibitiva, nacionalista e em alguns casos henoteista simplesmente reflete a limitada perspectiva das sociedades antigas. Um exemplo disso, podemos encontrar no quinto mandamento, que se baseia em um mito criacionista judaico em que Deus cria o mundo em seis dias e descansa no sétimo. Nada mais natural.

Descarto até mesmo a "atualidade" dos Dez Mandamentos, pois o Decálogo não é tão sofisticado quanto parece. Jesus e os escritores neotestamentários proporam uma nova leitura para ele ao dizer que o mesmo se resume em amar a Deus acima de todas as coisas e ao próximo como a si mesmo, mas não é isso o que ensina o Decálogo necessariamente. Uma pessoa, por exemplo, pode não cobiçar a esposa do próximo e não amá-lo ou "respeitar" aos pais e não amá-los. Em uma sociedade machista e com um modelo de escravidão como aquela as mulheres, os servos e as servas eram propriedades como a casa, o boi, o jumento ou qualquer outra coisa. Os dez mandamentos estão mais preocupados em zelar pelos bens das pessoas, manter um controle da sociedade e elevar a religiosidade.

Prova de que o Decálogo não é tão inspirado assim é que o mandamento da guarda sabática não respeita a proposta neotestamentária do amor a Deus e ao próximo. Embora, alguém diga que uma pessoa possa adotar o sabatismo por amor a Deus, e isso é verdade, a sua guarda é um excesso ao mandamento moral, pois não é uma descrição do caráter amoroso de Deus. Se Deus, segundo Anselmo de Cantuária, é o Ser do qual nada maior ou mais perfeito pode-se pensar deve ser também Todo amoroso e devemos ter a capacidade de encontrar nEle a ação de amar a Si mesmo e ao Outro sem ter a necessidade de criar o Outro. Para que Deus possa ser Todo amoroso não pode ter este amor apenas potencialmente. O mesmo deve ser uma realidade. Diante disso, concluimos que o mandamento de Jesus aos cristãos é um reflexo de Seu perfeito, imutável e amoroso caráter revelado na Trindade. Através do amor revelado na Trindade encontramos uma lei que se apresenta como uma descrição do caráter divino, o dever de amar a Deus e ao próximo, mas nunca de guardar um dia específico da semana. Se a instituição do sábado está ligada a uma idéia temporal ela não pode ser a demonstração de um caráter imutável e atemporal. O mandamento divino é uma descrição do Seu eterno e imutável caráter e a instituição do sábado não é eterna nem atemporal.

Certa vez um de meus amigos ao defender a moralidade teista alegou que não podem existir valores morais objetivos se Deus não os criou previamente, mas eu discordo em parte. Não creio que Deus tenha "criado" valores morais objetivos, mas sim que estes sejam uma descrição de Seu perfeito e eterno caráter. Talvez alguém alegue que o sábado seja um simbolo veterotestamentário de Jesus, mas esta é simplesmente uma leitura tardia na teologia cristã.

Jesus propôs uma leitura mais elevada para o decálogo que o transcendeu e o fuzilou de vez. Embora uma pessoa não roube o seu próximo pode ao mesmo tempo não amá-lo, mas se o ama se verá inclinada a não roubá-lo. Jesus nos apresentou uma sutil mudança de perspectiva em relação aos valores morais veterotestamentários sem comprometer a sua relação com os judeus de sua época que tanto divinizavam a Torá.

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