sexta-feira, 11 de maio de 2012

Existência De Deus E Argumentação

Nestes anos debatendo sobre a existência de Deus, tenho percebido que muitos dos chamados "argumentos para a existência de Deus" não são propriamente argumentos para a existência d'Ele. Pelo menos, à primeira vista. Digo isto, me baseando, por exemplo, em debates como os do filósofo William Lane Craig. Acho que a dicotomia teísmo x ateísmo não é suficiente para abarcar todas as questões levantadas nestes debates, mas apenas para satisfazer os interesses dos grupos de ambos os lados. A dicotomia que percebemos, na verdade, é entre naturalismo e sobrenaturalismo. É uma diferença sutil em relação à primeira proposta, mas elas não são exatamente a mesma coisa.

Argumento experiencial. O argumento experiencial, mesmo se fosse válido, não seria capaz de nos ajudar a saber se o que se comunica conosco é um Deus, um espírito de um morto, um espírito enganador, ou qualquer outra entidade sobrenatural... Mesmo que pudesse fazer isso, ainda assim não poderia nos revelar se o Deus que se comunica conosco é tão exclusivista quanto o Deus das teologias tradicionais. O argumento experiencial é invalido não só para provar a existência de Deus, mas é mais invalidado ainda quando o que se propõe a fazer-nos algo tão pretensioso como identificar o "Deus verdadeiro".

Argumento Cosmológico. Este argumento, no meu ver, seria suficiente apenas para argumentar a respeito de uma realidade além do nosso universo. Se quando entendemos Deus, como um Ser possuidor de determinados atributos, poderíamos dar ao cosmos apenas uma realidade sobrenatural, ou seja, ela precisaria ser Deus necessariamente.

Argumento Moral. É possível que algum ser seja moralmente perfeito e, que mesmo assim, não tenha certas qualidades como, por exemplo, ser atemporal, imaterial, onipotente, onipresente, e onisciente? Acho que podemos dizer que por não poder ser contingente, deve realmente ser atemporal e imaterial. Mas como no argumento ontológico, há uma exceção neste caso também. Uma vez que somente Deus pode ser moralmente perfeito, o argumento moral implicaria necessariamente na existência de Deus. Caberia apenas justificar a premissa "valores morais objetivos existem."

Argumento Ontológico. Se considerarmos o argumento ontológico, talvez ele seja o único capaz de argumentar a favor da existência de Deus. Penso assim porque o argumento está intimamente relacionado à definição de Deus.

Argumento Ressurrecional. O argumento ressurrecional não tem a finalidade apenas de tornar a existência de Deus mais plausível do que implausível, mas também de identificar qual seria o verdadeiro Deus. Em um debate com o popularizador islâmico Jamal Badawi, por exemplo, o Craig alega que o Alcorão não fornece uma base sólida para o Jesus histórico. Além disso, propõe o argumento ressurrecional como uma tentativa de demonstrar que o Deus cristão seria verdadeiro e Alá e apenas um mito. Entretanto, o Craig ignora que, assim como no cristianismo e no judaísmo, "religiões dos Livros" também, a crença de que o livro sagrado é inerrante não é necessária à fé. Outro ponto interessante também é que sobrenaturalidade não é prova de divindade. O que eu quero dizer com isso? Bem, este argumento pode ser interessante se for oferecido a um naturalista, mas não para um adepto de outra religião. Isto porque o próprio cristianismo não nega a possibilidade de um evento sobrenatural em outras religiões. A Bíblia inclusive, chega a citar vários casos onde supostos sinais sobrenaturais foram realizados por "pecadores". Ela chega a alegar que "espíritos enganadores" podem realizar sinais a fim de enganar os incautos. Esta ideia está tão bem desenvolvida nela que alguns cristãos fundamentalistas ainda vão um pouco além e anunciam a vinda de um anticristo que pode, entre outras coisas, fazer fogo cair do céu. Me lembro que quando eu fazia parte deste grupo, cheguei a me perguntar várias vezes "como eu vou saber identificar o anticristo? E se não for ele, e eu estiver rejeitando o próprio Deus?" Craig ignora também o pluralismo religioso e as teologias inclusivas, pois existe a possibilidade de Deus ser verdadeiramente experimentado em todas as religiões. Um evento sobrenatural de uma religião não poderia ser, por exemplo, um argumento contra a religião do outro. Baseando-me nisto, acho que posso dizer que a ressurreição de Jesus ou qualquer outro evento miraculoso não poderá nunca ser um argumento sério a favor do cristianismo. Creio que esta "briga" entre as religiões se dá muitas vezes por mero capricho de seus adeptos. Um homem de uma religião vê ao longe um outro religioso e pensa: "como aquele sujeito tem a ousadia de não adorar o meu Deus e ficar adorando o deus dele? O meu Deus me dá o sol, a terra e a chuva para plantar, os animais para comer, a vaca que me dá leite, e aquele ingrato perde seu tempo sem oferecer-lhe qualquer gratidão?!" De repente, o religioso do outro lado o vê murmurando e pensa exatamente a mesma coisa em relação ao primeiro. Ambos não percebem que os dois só possuem alguns costumes diferentes na prática religiosa. A chuva cai e falta para ambos, para os dois o sol aparece e se esconde. Não há castigo por causa da ingratidão de um deles. Na verdade, acaba sendo simplesmente uma questão de interpretação.

Creio que podemos concluir que a posição mais sóbria é o pluralismo religioso, mas confesso que por questões culturais tendo para o inclusivismo, ou seja, acabo por dar primazia ao cristianismo. O inclusivismo é possível, mas nunca poderemos saber se é ele ou o pluralismo a verdadeira doutrina. Ambas são logicamente possíveis. A verdade é que sempre seremos escravos de nosso limitado conhecimento sobre a realidade...

Não quero discursar sobre todas as possíveis implicações do pluralismo religioso ou do inclusivismo, mas se  ainda insistirmos em manter uma doutrina soteriológica e dermos o mesmo peso de valor ao pluralismo, ao exclusivismo e ao inclusivismo, concluiremos que a possibilidade do exclusivismo estar correto é de 1 em 3, ou seja, existe o dobro de possibilidade de uma teologia não-fundamentalista estar correta.

Como havia dito nos posts anteriores, sou um cristão inclusivista. Reconheço o pluralismo como uma possibilidade, talvez remota, mas o exclusivismo, dependendo do que se entende por ele, acaba me engasgando. Não desce.

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