quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Argumento Ontológico, Crenças Estereotípicas E Problema Do Mal

Digo que mesmo que a existência de Deus tivesse que ser uma verdade em todos os mundos possíveis, que isso ainda não implicaria em que ela seria de fato necessária, no sentido de ser impossível de se pensar o oposto, pois não é necessário que algum mundo exista. A lógica modal não pode ser reduzida à ideia de mundos possíveis, pois seria possível imaginar que não houvesse mundo algum, assim como seria possível a existência de um deus solitário sem qualquer interesse de criar qualquer mundo.

Dizer que deus, se existir, deve ser amoroso ou onipotente é como dizer que as listras negras sejam atributos necessários de uma zebra e que ela deixaria de ser uma zebra ao perder as listras. É o mesmo que dizer que negros são bons jogadores de basquete ou que humanos sejam pessoas. Mesmo que deus seja onipotente, a onipotência é, por si mesma, um atributo inútil em sua maior parte, pois não há necessidade de se ter tão exagerado poder para se viver.

Eu não sou essencialmente bom, ético ou amoroso, pois não deixaria de ser o que sou ao não ser nada disso.

Não há contradição entre a existência de Deus e o sofrimento no mundo. Mesmo que Deus seja o causador consciente e persistente de todo o sofrimento. Abraão não amava Isaque? Dom Quixote não amava o seu fiel escudeiro, o qual sempre vivia colocando em apuros? Penso que seja possível que um pai corte um filho em mil pedaços e faça isso com os mais sinceros sentimentos. Não me surpreenderia ao descobrir que o homem que mais me perseguiu durante a minha vida, e que mais tentou acabar com ela, seja o que me amou ao ponto de abrir mão da moral e que, vendo o meu sofrimento, cutucou a minha ferida por crer que isso acabaria por me garantir o paraíso. O amor pode se manifestar de várias maneiras e nem sempre tem a ver com uma tentativa de diminuir a dor. Estranhamente pode fazer exatamente o oposto, quando há uma ideia diferente de nobreza e virtude.

A moral secular é superior à moral religiosa em muitos pontos. Um deles é que ela se baseia em interesses humanos, pertencentes ao sensível. A moral religiosa, entretanto, se propõe a falar sobre os obscuros e inacessíveis interesses divinos.

O meu valor não está simplesmente no fato de eu ser humano. O que caracteriza um ser humano? Eu poderia, por meio de alguma experiência, passar a "morar" no corpo de um cachorro ou em um computador. Da mesma forma, um gato pode ser extremamente "humano". Se um ser humano é aquele que possui os genes humanos, eu deixaria de ser humano ao ter a minha mente transferida para um computador ou para algum "animal inferior".

Muito me incomoda o costume cristão de pedir a misericórdia divina. Se Deus realmente é misericordioso e imutável, não é preciso pedir para que ele seja aquilo que ele já é. É como pedir para que eu continue sendo homem e tendo uma cabeça, tronco, braços e pernas.

Se é compreensível que alguém estrague os sapatos tentando salvar um animal, é compreensível que alguém não queira matar animais para fazer sapatos.

Certamente há razões para o sofrimento. Entretanto, não há porque se pensar que tais motivos não causem, igualmente, sofrimento.

_

Nenhum comentário:

Postar um comentário